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CULTURA DO ASSÉDIO NO BRASIL

Definido pela Organização das Nações Unidas, o termo era pouco conhecido até recentemente, quando houve um aumento do uso pelos grandes veículos de comunicação.

Por:

AMANDA LUCENA

LUCAS COSTA
THAMYRIS COUTO

Cultura do Assédio no Brasil: Imagem

Paloma Bolognesi Roque, 24 anos, internacionalista, estava acostumada a dividir o transporte público com um vizinho e sua filha pequena, e a interação superficial exigia uma troca de gentilezas básicas como:  “Bom dia”, “Como vai?”

Após um período sem ver o vizinho, um dia encontrou-o por acaso na rua e decidiu cumprimentá-lo “ele se aproximou e inclinou-se para me abraçar, como quem faz com velhos amigos. Exceto que não éramos amigos – sequer sabíamos o nome um do outro. Ele também deslizou a mão até próximo a minha cintura – e um pouco mais pra baixo, chegando nos glúteos. Ao mesmo tempo, fez questão de me dar um beijo na bochecha. "Fiquei paralisada”, declarou Paloma sobre o episódio.

Além de apalpar o corpo de Paloma sem o seu consentimento, o vizinho começou a fazer perguntas inconvenientes do tipo “Como vai o namorado?” 


Tentando fugir da situação, Paloma disse que começou a sentir um leve pânico “minha respiração estava mais rápida do que de costume, e minhas mãos tremiam – até hoje, não sei se de raiva ou de medo. Eu queria fugir”.

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Mais casos sobre a cultura do estupro...

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a cultura do estupro “é um termo usado para abordar as maneiras em que a sociedade culpa as vítimas de assédio sexual e normalizar o comportamento sexual violento dos homens.” O termo era pouco conhecido até recentemente, quando houve um aumento do uso pelos grandes veículos de comunicação.
No Rio de Janeiro em 2016, uma adolescente sofreu um estupro coletivo em uma comunidade. O crime filmado chocou a população, mas também mostrou como a outra parte relativiza o estupro, com o pensamento de que só mulheres que seguiam comportamentos pudicos mereciam respeito e controle sobre o próprio corpo.
A vítima e a família precisaram mudar de Estado e entrar para o programa de proteção à testemunha, já que além de lidar com os traumas do crime e o julgamento de parte da população, ela era ameaçada pelo tráfico, já que o crime expôs à comunidade ao escrutínio da mídia e da polícia

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"Eu acredito em estratégias educativas"

Cintia Liara Engel

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Para Cintia Liara Engel, 33 anos, mestre em Sociologia, a cultura do assédio é uma prática compartilhada, comum e naturalizada na nossa sociedade. Ao abordar este tema, os especialistas querem chamar a atenção para o fato que assédios são comuns e muitas pessoas experimentam alguma situação do tipo ao longo da vida. Sendo uma questão social, esta questão relaciona-se com o fato de vivermos em uma sociedade patriarcal, não reconhecendo o corpo das mulheres como sujeito de direito.


De acordo com Cintia, como parte da cultura do assédio, alguns abusadores não se veem como agressores “é mais fácil reconhecer e chamar de estupro um tipo muito específico de relação forçada, que é uma relação com o desconhecido a partir de uma violência muito grande ou de uma ameaça com armas. Agora, quando as relações não consentidas acontecem em outros contextos, a palavra estupro não é tão utilizada. Algumas dessas práticas que são naturalizadas e não são lidas como estupro”.

Segundo a pesquisadora, a desconstrução da cultura do assédio começa com a criação de estratégias educativas de forma ampla, discutindo sobre sexualidade não violenta para diferentes perfis etários e de orientação sexual, além da promoção de espaços de acolhimentos para as vítimas. 

Cintia também ressalta a importâncias de estratégias que não sejam somente punitivas para os abusadores: “eu acredito em estratégias educativas de forma ampla e aberta, então todas as estratégias que eu penso, particularmente, está relacionado com educação e transformações culturais”, declara, sobre os meios para combater a cultura do assédio e transformar a sociedade.

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Jornalismo contra a cultura do assédio

Na opinião da jornalista Pâmela Caroline Stocker, 36 anos, o jornalismo tem uma responsabilidade no combate à cultura do assédio cumprindo seu papel social, que muitas vezes é esquecido e aí está a sua essência. 
Pâmela realizou uma pesquisa em 2016, onde analisou a reação dos leitores do jornal Diário Gaúcho a uma reportagem publicada online em 2 de junho do mesmo ano, em que acompanha uma mulher ao centro de Porto Alegre – RS e registra as reações dos homens direcionados a ela. Dos 261 comentários válidos que podiam ser analisados pela jornalista, 201 haviam reações negativas, que iam de críticas ao seu modo de se vestir, argumentos machistas que tentavam normalizar o assédio e críticas ao veículo pela abordagem do tema. Entretanto, ela observou que não houve réplica do jornal aos comentários tóxicos e que era uma prática comum de vários veículos analisados sob a mesma perspectiva. Os jornais fazem a reportagem, abrem espaço na caixa de comentários, mas não se responsabilizam pelo que acontece nesses comentários. 
Pâmela considera que isso é uma postura muito masculinista do jornalismo, e existem maneiras de trazer informação para as pessoas, e a forma dita natural do jornalismo é a autoritária de informar. “É preciso o jornalismo se posicionar, responder esses comentários. Não dá para ficar fingindo que isso aqui não existe, que está só na internet. São pessoas reais, então precisamos bolar estratégias para atingir essas pessoas que estão comentando, não basta largar bomba ali e deixar as pessoas brigando”.

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COMENTÁRIOS ANALISADOS

Dos 261 comentários analisados pela Pâmela,  houve 201 reações negativas, que iam de críticas ao modo da persongagem se vestir, até críicas ao veículo pela abordagem do tema.

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Pâmela relembra sobre o papel que o jornalismo exerce na vida das pessoas e chama a atenção ao fato que por muito tempo o jornalismo deu muita importância a acontecimentos do dia a dia e deixou de olhar para as pautas de uma forma problemática. O fato de o leitor estranhar a problematização de uma matéria que aborda o assédio é responsabilidade da imprensa, que nunca julgava que esses temas seriam de interesse da população, suprimindo essas narrativas.

Apesar das questões levantadas por ela em sua pesquisa, que durou de 2015 a 2019, Pamela notou um aumento da abordagem da temática do assédio em grande parte graças à renovação que vem acontecendo no jornalismo, porque há outras pessoas indo para as redações e sugerindo pautas diferentes, e também da contextualização dos temas ao invés de simplesmente informar o acontecimento. Ela também notou que houve uma mudança na abordagem do tema e que pautas mais voltadas aos valores femininos  e mais sensíveis, que trazem o indivíduo para o centro, escutando o que ele tem para falar, faz o leitor ter um comportamento diferente. 

A luta contra à cultura do estupro é muito recente. Começou quando termo foi cunhado por feministas americanas na década de 70, portanto a conscientização começou há cerca de 50 anos. O enfrentamento do problema depende de vários fatores, mas o fim da culpabilização da vítima talvez seja o mais importante. Atos sexuais devem ser totalmente consensuais entre as partes envolvidas, que devem estar em total controle de suas funções mentais. Qualquer coisa diferente disso ou que continua depois que alguém diz NÃO é estupro. 

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“Culturalmente todos nós nascemos dentro de um mesmo caldo de cultura e esse caldo de cultura é machista, é racista, ele é classista, é LGTBfóbico e nós nascemos imersos nisso. Então ao longo da vida a gente pode trabalhar para desconstruir isso”

Pâmela Caroline Stocker

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